domingo, 9 de dezembro de 2007

Sem Reflexo


Uma negra borboleta pousou em meus ombros, deixei que ela me levasse pela dança de suas asas. Ressurgindo pela morte, e não dela. Sem escolha ou força, deixei a cabeça tombar em direção ao peito. Agora os olhos se erguem e após o funeral eu serei a essência dela e ela meu coração.
Nos meus lábios um único gosto, um estigma em minha pele, cicatriz eterna. Tento conter o sangue toda noite, mas a cicatriz ressurge ao amanhecer.
O rubor desaparece. Pálida, não me olhe assim, não me julgue ou me venere.
Esta fera grita, somos espetáculo de Quixote. Adormeço como Bela-Adormecida, meu sono não tem nada de belo, é apenas profundo e denso.
Neste cruel pesadelo
Faz-me bizarro com teu veneno
Cria seu filho em meu ventre
Adormece-me com teu zelo
Pinta meus olhos de negro
Camufla a pele com essas vestes
Está frio lá fora
Também não há pinturas, os desenhos sobre sua mesa estão espalhados e apodrecendo. A poeira tira o brilho do verniz recente da madeira velha. As portas rangem, os galhos batem nas janelas, as árvores ancestrais quase cobrem a visão da igreja, do pequenino mosteiro sobre a colina e do cemitério atrás dos framboeseiras.
As casas amontoam-se e rejubilam nos interiores chamas alaranjadas como grandes flores. O ar tem vários cheiros, o café do bar decadente na entrada desse prédio velho, o vinho aberto sobre a mesinha ao centro da sala, quase posso jurar que este novo cheiro delicado, suave, “úmido”, de uma doçura quase acida e refrescante seja o cheiro do sereno.
Sinto as costas rasgarem de dentro para fora, onde esta sua mão para segurar a minha? Você demora da caçada, eu volto a regurgitar o sangue. Sinto muito frio. Estigma cada vez mais aparente em minha pele. Asas de borboleta. Estou com frio.
Sem orgulho rastejo, entra a essência da borboleta pelas minhas veias, o vestido branco enegrece, sinto o sangue escorrendo em minhas costas, agarro-me no grosso batente da janela, tudo aqui é desumano, turvo, embriagador, céptico, assustador, hediondo, sujo, velho, decrépito, belo.
Uma grande sombra me cobre. E não há reflexo meu no espelho...Onde esta você para segurar minha mão, estacar meu sangue, e me segurar com seus braços fortes?
Sombra negra. Grandes asas surgem e tampam a lua. Torno-me vagarosamente esta borboleta enquanto a dor me trucida. E, estas grandes asas que tampam a visão para a cidade, eu sei, você ira chegar.
Neste cruel pesadelo
Faz-me bizarro com teu veneno
Cria seu filho em meu ventre
Adormece-me com teu zelo
Pinta meus olhos de negro
Camufla a pele com essas vestes
Está frio lá fora.

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