domingo, 9 de dezembro de 2007

Falhos Soldados



Falhos soldados esquecidos tropeçam na estrada. O coração chora, a alma devora qualquer vontade de existir... Eles arrastam suas armas sem munição, a bandeira rota limpa o sangue do homem tétrico que sussurra seu perjúrio para as árvores, e os jovens, fatigados das batalhas, choram por seus amores exilados. Ah! Cede a luz que oscila na névoa, um repouso, um refúgio, uma fuga da marca no peito: uma ferida aberta que explora o coração, uma visão, um templo sagrado onde possam se curar as feridas e sejam apagados os rostos deixados para traz. Que o caminho oprime os envelhecidos da guerra. Os corações que se perderam no tempo do cárcere e não chegam mais a se arriscar na tempestade colorida das armas de fogo.
Vento sopra medo, fica quieta a canção da vitória no porvir, apenas cega o futuro, rasga a farda e abandona a espada, não há mais pelo o que lutar.
Ah... pede um drink no bar, brinda o cavaleiro das sombras. Corrói os corpos e deixa sobre a mesa, o coração de quem morreu pelo menor preço. Os que foram caros, os coloca nos bolsos, e os leiloa logo mais.
Sujas faces, nada limpa tão profunda insatisfação, e como dói o compasso do tempo, nada em que se acreditar para seguir agora.
Uma bala no peito, um rasgo nas entranhas, e tudo esta devastado. Não existem pássaros que cantem o choro, todos se calam, se fecham, gritam com seus olhos o desespero. Ameaça uma lágrima que não cai, duas lágrimas que não caem, mas a cada metro, outro soldado cai, permanece e se apaga, sem rosto, sem amores, apenas a marca de seu ferimento, fratura exposta na história. Eles seguem, vegetam, padecem e somem na névoa quando se apaga a luz.

Sem Reflexo


Uma negra borboleta pousou em meus ombros, deixei que ela me levasse pela dança de suas asas. Ressurgindo pela morte, e não dela. Sem escolha ou força, deixei a cabeça tombar em direção ao peito. Agora os olhos se erguem e após o funeral eu serei a essência dela e ela meu coração.
Nos meus lábios um único gosto, um estigma em minha pele, cicatriz eterna. Tento conter o sangue toda noite, mas a cicatriz ressurge ao amanhecer.
O rubor desaparece. Pálida, não me olhe assim, não me julgue ou me venere.
Esta fera grita, somos espetáculo de Quixote. Adormeço como Bela-Adormecida, meu sono não tem nada de belo, é apenas profundo e denso.
Neste cruel pesadelo
Faz-me bizarro com teu veneno
Cria seu filho em meu ventre
Adormece-me com teu zelo
Pinta meus olhos de negro
Camufla a pele com essas vestes
Está frio lá fora
Também não há pinturas, os desenhos sobre sua mesa estão espalhados e apodrecendo. A poeira tira o brilho do verniz recente da madeira velha. As portas rangem, os galhos batem nas janelas, as árvores ancestrais quase cobrem a visão da igreja, do pequenino mosteiro sobre a colina e do cemitério atrás dos framboeseiras.
As casas amontoam-se e rejubilam nos interiores chamas alaranjadas como grandes flores. O ar tem vários cheiros, o café do bar decadente na entrada desse prédio velho, o vinho aberto sobre a mesinha ao centro da sala, quase posso jurar que este novo cheiro delicado, suave, “úmido”, de uma doçura quase acida e refrescante seja o cheiro do sereno.
Sinto as costas rasgarem de dentro para fora, onde esta sua mão para segurar a minha? Você demora da caçada, eu volto a regurgitar o sangue. Sinto muito frio. Estigma cada vez mais aparente em minha pele. Asas de borboleta. Estou com frio.
Sem orgulho rastejo, entra a essência da borboleta pelas minhas veias, o vestido branco enegrece, sinto o sangue escorrendo em minhas costas, agarro-me no grosso batente da janela, tudo aqui é desumano, turvo, embriagador, céptico, assustador, hediondo, sujo, velho, decrépito, belo.
Uma grande sombra me cobre. E não há reflexo meu no espelho...Onde esta você para segurar minha mão, estacar meu sangue, e me segurar com seus braços fortes?
Sombra negra. Grandes asas surgem e tampam a lua. Torno-me vagarosamente esta borboleta enquanto a dor me trucida. E, estas grandes asas que tampam a visão para a cidade, eu sei, você ira chegar.
Neste cruel pesadelo
Faz-me bizarro com teu veneno
Cria seu filho em meu ventre
Adormece-me com teu zelo
Pinta meus olhos de negro
Camufla a pele com essas vestes
Está frio lá fora.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Anátema




Uma mácula do apodrecimento.
A expulsão e o sofrimento.
A saudade e o medo não são mais inimigos.
Maldição, as dores e os castigos.
Um poema com meu sangue escrito.
Vinhos e lagrimas,
Tempestade lá fora regando minhas lástimas.
Expulsa!
Pelo portal dos sonhos,
Adentrei em meio às nevoas,
Trevas desta insignificância.
Devota do inferno do arrependimento.
Esta contido na minha vida um manuscrito.
Anátema, meu castigo.
Mácula da imperfeição.
De lúbrico a esconso
Ocultando o jovem ancião,
Que à mansão dos mortos me levou.
Anátema, cruel e perpétua,
Dissolvendo com gritos de dor, meu coração.
Berros solitários, gelando minha pele nua
Sendo cortada com facas flamejantes,
E o suicídio rindo de mim distante.
Anátema, maldade e matança;
Anátema, trevas à lealdade;
Anátema, louca desesperança;
Anátema, fim dos séculos...saudade;
Anátema, fim dos sonhos de crianças;
Anátema, mancha de sangue e sofrimento;
Anátema, sozinha, oh morte, eu te lamento;
Anátema...


Uma de minhas primeiras poesias, quando
 aos quatorze anos, me aventurava a escrever.

À noite



À noite,
Alguém sem nome faz uma enorme falta.
Alguém perdido talvez também se embebede desta melancolia.
Talvez toda nossa poesia seja apenas uma.
Rostos fúnebres.
Máscaras:
Para esconder minha vergonhosa face e meus impulsos,
Para revelar meu interior.
Nada faz sentido quando é dia.
Eu me perco.
Eu me camuflo, me escondo, me mordo, me esqueço.
Suicidei-me...
Agora tento me ressucitar.
Quero as portas do cemitério.
Morta neste abismo, me desça um gole do seu rum.
Fantasma, cante.
A décima segunda badalada que não chega.
Um colo no calabouço.
Suspira este ar gelado.
Envolve no silêncio de seu mausoléu...
Voltar a ser poetisa.
Chora meu espírito com medo de morrer nesta mediocridade.



Poema de abertura da revista eletronica R.I.P., edição 05.

domingo, 26 de agosto de 2007

Devaneios Inconsequentes



Devaneios inconseqüentes, minha cara!
Quem mais diria desta forma tua esperança?
Que maior vontade te iluminara
No despertar da tua sagrada infância?

Nenhum motivo que te guie ou perfume.
Quem te carrega é tua injustiça.
E não mais lhe proverá o lume
Para teu doce cheiro sumir e tornar-se carniça.

Nada criança, é como tua vaga menção conduz.
Desnudas a carne e o peito oprimido na névoa.
Cobre apenas tuas madeixas com negro capuz,
Para que não te enforques nos cachos das trevas.

Perdoa, anjo, minha lisura desmedida.
Que a muito deixaras te cair no abismo
E a pouca luz do teu outono esta perdida.
Salta para teu acabrunhado lirismo.

Aprendes com os corvos, e te acometas na tua dor.
Impõe teu pesar e pesas esta vontade de sorrir
Que teu sorriso mais me mata que me traz calor.
Neste olor à dor de não poder partir.

Medes o tempo no asfalto e na calçada
Calas teu orgulho e me permite a mão fria.
Teus portões na mentira da paixão calada
Mentes e tomas meu amor por areia fina.

Das-me apenas esta face mascarada lazuli,
Gelada pelo ártico de uma profunda ambigüidade?
Não me aceitas ou me domina em tua buli
Julgas-me, anjo frágil de madeira, sem veracidade.

Deixais de turvações, cara, e te colocas em meu colo
Ou vai logo ao Demônio que devora graça tua.
Pois perder-te me é fúria e beleza de Apolo:
Visto que mata o verme e junto a beleza nua.

sábado, 21 de julho de 2007



Não há lembrança alguma que poderia, o pesar, roubar-me
Nem mesmo o olor da flor mais frágil.
Nem mesmo a voz rouca da garganta seca de meus ancestrais fantasmas.
A vela não seria capaz, da alcova, iluminar toda esta espectral paisagem .
Minha mente cala-se no vácuo da noite, na calada do vento da montanha.
Na face rósea de Vênus, eu vi rolarem as pérolas deste amanhecer.
Para nunca mais ver quem me embriaga, Hécate tampou-me os olhos,
Mesmo que eu tentasse forçar a memória, o vinho que tombei
- à garganta para que me fizesse morrer sem culpa em quaisquer braços –
Corou-me as bochechas e me dilacerou a carne.
Como um bufão, tortuoso em meu andar, e com o corpo a balançar,
Deitei-me aos pés da Lua humilhando-me no folguedo dos nobres.
E do corpo torcido, manco, corcunda e com o rosto disforme
Arranquei em minha rudeza os cravos e jasmins.
Riram de mim todas as máscaras do teatro, depois de muito correr dei-me por vencido.
Não houve donzela que me amou, tampou um amigo a me aconselhar.
E os gritos, malditos rugidos no qual revelou-se minha besta.
Ah, fera! Colocou-me nesta jaula com meu comportamento nefasto.
Bruxa que me percebeu insensato,
Deixou-me aqui – com o gosto amargo de seu elixir –
Acorrenta-me, pobre palhaço, não há nada que me aprisione mais que a solidão
E nem maior vontade que me liberte, que alcançar uma migalha de pão.
- rolou da mão da dama jovem... caiu... mas não alcanço.
Que belo desejo poderia um bufão sem riso ter?
Se eu pudesse, cantaria para alegrar quem me cega.
Pois se o sol por ventura bate neste calabouço, é apenas o pendulo de minha agonia.
Que nem seu brilho vontade alguma me traz.
Nem memórias, nas quais eu pudesse me refugiar.
Maldito Rasputin, até o que havia neste coração levou.
Voou com o vento... se foi.
Quando durmo sonho com a jovem de cabelos castanhos ao piano.
Que indecência, nem saberia dizer se é minha esposa ou filha.
E se não for ninguém? Melhor que seja um vulto,
Como sou no pesadelo das crianças que com meu horror se assuntam.
Chicoteiam-me os cavalheiros, me pisam seus cavalos.
Eu cheiro a esterco.
Mas é um alívio nas horas de tortura poder sentir o cheiro da grama.
Minha morte vem ao poucos, e cada vez acredito que demore mais a chegar.
Pois quando penso em eternidade, lembro de uma saudade de alguém
Que pode não ter existido, e a sina de nunca ter amado.
Mas se é noite de festa, eu posso me aliviar.
Mais uma vez me embriagam, e mais uma vez eu me humilho para Lua.
Talvez Vênus tenha pena de mim, pois sempre vejo suas lágrimas no orvalho.
Tenho dormido todas as noites sobre meu próprio sangue,
As feridas não cicatrizam...
Daí nenhuma lembrança... nem a voz baixa do padre.
Encomenda minha alma ao diabo, velho, que esta face horrenda
Não merece repousar ao lado de Deus.
Turvou-me a visão, o vinho, e destruiu-me a razão.
Sem saber de onde eu vim, só conheço a canção dos camponeses.
E fiz dela algo meu, onde eu canto feito tenor, e todos pensam
Que sou um anjo.

Para onde as flores vão no inverno

"Como uma furiosa serpente a corrente dos acontecimentos devorou meus anseios e esperanças, uma a uma, minhas vontades foram oprimidas. Porém confesso minha culpa neste tribunal – onde o ar rarefeito me sufoca – eu deixei que elas se calassem. Sei o destino ao qual pretendo chegar, conheço minhas sinas futuras e os pecados de meu passado, mas sempre parece haver uma curva onde não devia existir. E por que eu volto no tempo? Talvez acredite que relembrando, se reviva e assim, talvez exista algo no passado que eu possa mudar: um livro que eu não li, a letra de uma música que eu não entendi, uma porta fechada, uma janela aberta.
Tudo foi morrendo, e as flores no jardim eu parei de regar.
Nem mais pessimismo!
Mas remoer-se todos fazem, os indiferentes, os desiludidos, os suicidas, e eu não serei mais uma que nada acrescenta.
Quando achei que todos não reparavam, descobri que alguém se importa.
Por este motivo (e na esperança de me tornar quem realmente sou) dedico a beleza de uma filosofia de vida – que pretende em sua natureza revelar o divino de cada sentimento – aos olhos de uma criança.
A pedido de uma grande amiga."

 *

Quantas framboesas! Muitas, incontáveis e inexplicáveis.
- Mãe – perguntou Lorena a sua mãe que fazia um café fresco naquele entardecer - Para onde as flores vão no inverno?
O cheiro do café que mãe de Lorena fazia, preenchia não só a cozinha, como a sala, os quartos, a casa inteira cheirava a café fresco.
Sentada à mesa da cozinha, Lorena entediada de treinar sua caligrafia, fazia desenhos de flores no pé das folhas do caderno. Olhou mais para o meio da mesa e viu seu giz de cera espalhado junto com folhas em branco. Preparava-se, emocionalmente e com cautela, para deixar o caderno e se por logo a pintar. Mas sabia que ao fazer isso levaria um pequeno puxão de orelhas por não ter terminado a lição, achou melhor conter essa vontade. E foi neste suspiro de quem sabe que deve esperar o final de semana para ir ao parque, que Lorena pões os olhos sobre uma antiga foto amarelada de seu avô, pai de seu pai, falecido há pouco tempo. Lorena não saberia dizer o tempo exato (arregalou os grandes olhos castanhos sobre a foto) mas sabia que era recente pelo tamanho da dor que ainda sentia.
Lorena lembrou que as morriam no inverno, ligando assim a idéia da perda recente. Havia sido o inverno de seu avô.
- Mãe, para onde as flores vão no inverno?
A mãe de Lorena estranhou a pergunta. Sentiu pela voz da filha que não era bem isso que ela queria saber.

Ah!O cheiro de café por toda a casa. Na sala o rádio ligado com o volume baixo não deixava o silêncio reinar. O locutor tinha uma voz grave e macia – Voz de travesseiro, parece que ele fala no nosso ouvido, dizia sua mãe – Desde então, quando durante a noite Lorena contava seus segredos para o travesseiro, era com essa voz que ele respondia, aconselhava e conversava com a pequena.

A mãe de Lorena serviu-se de café, em silêncio virou-se na direção da filha, cortou um pedaço de bolo e passou nele um pouco de geléia. Sentou-se a mesa. Percebeu que Lorena arregalava os olhos sobre a foto do avô, deu um suspiro e Lorena pensou que aquele suspiro era diferente, não era suspiro de quem espera para ir ao parque, era outro suspiro. Era suspiro de pesar.
A mãe de Lorena bebeu um gole do café já adoçado, engoliu, continuou sentindo o gosto. Ela disse a Lorena, com um doce sorriso, que as flores iam para o céu.
Mas para Lorena, isto não fazia muito sentido, a única coisa que lhe importava era a dor da saudade, aquele vazio imenso que seu avô havia deixado. Quis saber o que fazer com a saudade, ela queria parar de sentir dor, não queria mais que lágrimas caíssem antes do sono.
Olhou em volta como se tentasse descobrir algo, nas paredes e em sua volta, que lhe fornecesse meio de diminuir sua dor. Assustada percebeu que até as flores do pequeno vazo na sala haviam morrido. Viu na estante fotos de parentes que não estavam mais com eles.
Na sala, Lorena ouviu um barulho novo, seu pai chegava cansado e com os passos vagarosos. Apesar de jovem, seu pai era muito pálido e magro, o que lhe tornava extremamente parecido com seu avô.
Mal seu pai acabava de sentar no sofá de estampas gastas, Lorena largou seu caderno e foi ao seu encontro. Por alguns segundos permaneceu imóvel, bem a frente de seu pai, seus olhares se alto sustentaram. Estáticos! Lorena temerosa por achar que poderia estar próximo o inverno de seu pai e este confuso e atordoado pelo semblante da filha.
- Eu não quero sentir saudades de você, pai! – Disse Lorena quase me lágrimas.
Vagarosamente deitou-se no colo do pai, segurando com força sua camisa, se acolheu naquele canto sagrado.
O pai de Lorena, curioso e comovido pela demonstração de carinho da filha, a abraçou e do cansaço passou a uma grande calmaria.
Lorena acabou perdendo a noção do tempo em que estava naquele colo e naquele abraço quente. Pensou, formulou muitas questões e idéias sobre a partida, sobre sentir-se sozinha, sobre o choro – Mas nós não enterramos as flores!- murmurou ela. Descobriu que seu pai era o botão de seu avô, ela seria o mesmo de seu pai e um dia teria seus botões.
Fechou os olhos com força, como se assim agarrada ao pai, ela pudesse evitar que o inverno chegasse.
A noite ficou imensa lá fora, e logo estava dentro de sua casa. Sua mãe sentou-se ao lado dos dois e finalmente a pequena adormeceu.
A manhã seguinte também amanheceu fria, mas algo havia mudado.
Bem quieta foi até a cozinha, pois seus cadernos ainda estavam sobre a mesa.
Encheu um copo com leite, passou a geléia de framboesa em algumas torradas e começou a escrever:
“Oi vô, ontem eu descobri para onde as flores vão no inverno, elas vão perfumar o céu! Mas eu descobri que nós, aqui na terra, podemos sentir ainda o perfume das flores com a lembrança. Mas, vô, a lembrança não é a mesma coisa, por isso eu chorei muito, eu senti muita falta, eu quis que meu inverno também chegasse.”
“Fiquei com muito medo de perder outras flores, e nada eu poderia fazer para impedir isso. Mas foi quando abracei meu pai que descobri a terceira coisa, que sem dúvida é a mais importante: quanto mais eu sentir o perfume da flor, mais forte a lembrança dela ficará na memória.”
“Eu acho que a dor, a tristeza e a saudade, apesar de dolorosas, são importantes, pois assim, vô, eu sei o quanto as flores são importantes na nossa vida, e só o que eu não quero é me arrepender de não ter olhado para todas elas, que todos os dias, de graça, me oferecem o colorido da vida e o cheiro bom das manhas.”
Lorena dobrou a carta, andou com os pés descalços de menina sapeca até a foto do avô que já havia voltado para a estante, deu um beijo na foto e guardou junto à carta.
Na semana seguinte, Lorena não quis ir ao parque, fez com que sua mãe levasse-a até o túmulo de seu avô. Lá, ela plantou a semente de uma flor amarela e prendeu, na lápide, a carta com a cera da vela.
Lorena nunca explicou sua pergunta, mas para ela já era o suficiente saber o que fazer da saudade e da falta que as flores fazem no inverno.

sábado, 9 de junho de 2007

Equilíbrio

 

Hoje eu quero um silêncio amigo, e um amigo como o silêncio. Melancolia de refúgio e um cálice vazio na mesa. Voarei nas asas de vampiros, dormirei quando os gatos e os morcegos dormem. Durante a madrugada seremos solenes. Trancarei-me na paz do outono, recostarei minha alma cansada sobre a folhagem da arte. Vou de encontro ao sepulcro dos pesadelos, enterro meus pés na grama úmida do orvalho. Deixaremos as janelas à luz da lua. Sem embriagues, mantendo o espírito na base da confortante quietude. O horror poderá servir de encontro às profundezas da sabedoria. E quando observar a cidade só respirarei o que há de misterioso e que dialoga com minha interioridade e introspecção de tempos românticos perdidos.

Triste



Mantenho-me aqui – perdida.
Solitária e cheia de lágrimas.
Onde meu corpo empalidece quase sem vida
E cheia de lástimas.
Choro – escondida – comedida.
Acometida num mundo louco
Onde se possa degustar da solidão.
E se choro, meu pranto é rouco,
E calando-se, se vai a devoção
Por todos os meus sonhos belos,
Hoje, infames e em flagelos.
Será que, pra minhas agonias,
Há de haver respostas?
Só me quer a melancolia
Com suas mórbidas propostas.
Então a dor me deixa aqui, assim,
Sem acreditar num feliz fim.

O Sentido.



É sentir na pele o vento frio,
Ver a verdade nos olhos de outrem,
Sentir que a luxuria tirou-lhe o brio.
Ver que só nas sombras há o além.

Ter medo de em cada passo pisar em falso.
E a adrenalina ferver-lhe a alma.
Com o sofrer prender-lhe em laço
Mórbido, onde se esvai a calma.

Jamais beijar o céu de amores,
Nunca vir a alcançar o sorriso,
Pois a tristeza lhe excita em louvores
E, da angustia vê sempre o riso.

E por mais loucos no correr em passos largos,
Não chega na ventura de feliz viver.
Só as lagrimas lhe acompanham com afagos.
De carinhoso, só tens, seu sofrer.

E ao correr deixa para traz,
Mais dor, mais medos, mais lágrimas.
E mais forte a solidão faz
Com que os prantos sejam dogmas
Para seu lamento voraz.

E assim vai ficar – chorar. Estar ai a sofrer.
Assim para sempre vai calar,
Vendo noutros olhos seu morrer.
Nesses olhos do funesto pesar.

Minha Deusa de Branco




São aquelas memórias,
Longe de algo que eu possa aceitar.
São lugares distantes
E vozes distintas me abraçam.
Eu caminho sem pressa.
Eu viajo solitário.
Uma deusa de branco me espera.
Eu sorrio e me entrego,
Sem hesitar e sem escolha.
A cada passo a floresta é mais escura,
E os pássaros cantam para mim.
Eu me perco e tento achar
A luz da vida ainda acesa.
Novamente tudo parece um sonho,
Um sonho onde estou presa.
Sinto a nostalgia,
É um perfume doce
Que acende a minha alma.
As vozes são misteriosas.
No céu brilha a lua.
As folhas no chão, mortas,
As flores resistem ao frio,
A deusa de branco me chama,
Eu não vejo seu rosto na neblina,
A penumbra o cobre.
Ela é minha salvação,
A porta para a liberdade.
Mas quando me entrego
Ela me deixa sozinho neste sonho.
Em sono profundo
E sem saída para a vida.
Eu vejo a luz nascer e morrer
Muitas e muitas vezes.
Minha esperança se desfaz.
E a deusa de branco
Sem me levar com sua luz.
Ela me esquece nas sombras
Das memórias.
Eu revivo cada instante
E me pergunto: Por que?

sábado, 12 de maio de 2007

Cordel















Dê-me de tua sombra uma faísca,
Um lapso em teu passado.
Mistures esta dor em saliva, lasciva
Morta que eu me estendo ao lado
Deste teor de odor ao qual me sujo.
Venero o cheiro, neste néctar me aprofundo.
Acorrento-me a esperança de teu zelo.
E pelo o que mais prezo e desespero eu juro!
Proclamo à vista de meus demônios,
Ergo o orgulho, mas abaixo a cabeça aos anjos,
Que dentre meu canto, teu nome, permanece puro,
Mas mantêm sobre ti os olhos jônicos,
De carretéis e curvas que ti seguem.
Que meu jeito de sorrir é em preto e branco,
Já que meu choro só os espíritos percebem.
Assim, corda que sustenta meu fio pálido de vida
E pende o corpo a deitar ao chão,
Conta minha sina no barbante de cordel
Que a ti minha luz não passou em vão...
Apaga-se
Que meu jeito de sorrir é não sorrir ao léu.
E se me despeço...

terça-feira, 1 de maio de 2007

Anjos


Foi a primeira coisa que nós vimos, descendo do céu estrelas cadentes durante o dia.

Anjos
Os anjos estão caindo, meu amor, estão perdendo altura, suas asas tornam-se granito aos poucos, nós não vemos saída, sua luzes cintilantes estão nos cegando, seus gritos de dor estão rasgando nossos ouvidos.
Querido, chovem asas de borboletas sobre nós.
Em algum momento eles ouviram o chamado, nós corremos para as catedrais e para os castelos: “Vamos nos abrigar do vento e da tempestade, os anjos estão caindo sobre nós”.

A queda
Estamos correndo em círculos, estamos perdendo a guerra, eles caem sobre nós, seus corpos nos pulverizam, e na agonia de planar por mais alguns estantes o balançar de suas assas levantam os furacões da terra.
Vamos nos arrastar como vermes ao horizonte, nos manteremos cegos, surdos, como também nossos gritos rugem em uníssono. Temos medo, o pavor congela nosso rosto, esta frio no paraíso desumano das criaturas de sonhos, esta quente como no inferno, adrenalina, esta nevando cinzas... Abrace-me, estou com medo.
Caindo...

Inferno
Vamos nos esconder no inferno, vamos nos trancar da luz resplandecente que desce sobre nós lá fora. Vamos nos enforcar com lágrimas, jogamos fora o cálice da esperança, não há mais vinho, não há mais pão, vamos nos sufocar, vamos pendurar a corda.
“Desça pela escada de mármore, desça criança, my moonchild, de me a mão, segure pelos corredores, guie-se pelo odor dos jasmins, desça”.
Nós não precisamos entender, o grito de dor dos anjos...Seus corpos lá fora estão sangrando, nós estamos morrendo em desalento, nossas mentes estão sangrando.

A Mansão
Qual jardim nos pertence? Qual crime estamos cometendo? Qual castigo é meu castigo?
Pelo portão, vamos correr, atravessar entre as árvores, pelo caminho de pedras, até a porta da mansão. Bater na porta de cedro, depois de passar a fonte. Corra eles estão caindo. Truculentos e pesados corpos sobre nós, morrendo embaixo dos anjos, esmagados.
Sua perna esta quebrada, segure minha mão, não vou deixar você aqui para morrer. Agüente mais um pouco... Sim! Minha cabeça esta sangrando, mas não há tempo agora, só mais alguns passos, até já vejo a fonte, só mais alguns passos. Por favor não pare, não solte minha mão, só mais alguns passos.


Relatório (Parte 1)
(Barulho de máquina de escrever).Nunca foi documentada uma guerra onde tivéssemos tanta certeza de ter perdido-a antes mesmo de ter começado, quem nos mata, pobres anjos para quem rezamos, não tem escolha à não ser cair sobre nós, destruir nossos lares, nossas famílias, nossas flores. Eu prefiro não correr, prefiro meu último gole de cafeína e minha velha máquina de escrever (não temos mais energia ha algum tempo desde que eles chegaram).
Como nunca fiz nada em favor da humanidade e ontem eu jurei para alguém que eu poderia ser diferente, esta é minha contribuição.
Não posso dizer em que parte do mundo isto começou, aparentemente a energia que eles emitem causam alguma espécie de “pani” nos nossos aparelhos elétricos e interferências em linhas telefônicas, ondas de rádio e aparelhos de televisão, ou seja, primeiramente a região afetada fica incomunicável com o mundo. Quando chegam um pouco mais próximo é sua luz cintilante (e bastante fosforesceste)que nos ameaça e queima nossos olhos. Aqueles que se encontravam ao ar livre admirando o espetáculo daquelas estrelas à luz do dia foram os primeiros a sofrerem os efeitos dessa luz, obviamente os próximos tentaram tampar os olhos e cobri-los de alguma forma, foi em vão, um a um ficaram cegos, houve aqueles infelizes que, assim como eu, tiveram só uma parte da visão danificada podendo ver, apesar de tudo, com clareza o que se segui...

O Forte.
Talvez agente sobreviva, respirando fundo, aqui dentro estamos seguros, eles não são tão grandes para destruir esta construção...Talvez sejam...Mas eu confio, eu acredito que nós vamos escapar vivos, sei que esta doendo, a gente tem perdido cada vez mais sangue, posso sentir, as ataduras vão funcionar, só não podemos desmaiar.Ficaremos pelo menos com nossa voz e nossos ouvidos, vamos poupa-los.
Isto é um Forte, sobreviveu a tanta coisa, séculos e séculos esta construção esteve de pé, protegeu reinados, crenças, povos inteiros puderam contar sua história.
Acredito que depois de tudo, outros também terão sobrevivido, acredite em mim (silêncio).Você ainda esta sangrando muito?(silêncio) Você esta me ouvindo?(silêncio) Você pode falar?(silêncio) Será que sou eu que não ouço mais? (silêncio) Você esta aí?(silêncio) Esta me ouvindo?...(silêncio).


Cadavérico
Já que me levaram a visão e os ouvidos, poderiam ter me levado também o olfato. Eu sei quanto o horror esta próximo pelo cheiro que vem dele...Sangue, fumaça, óleo e gasolina dos carros, adivinhe quem vai provocar um incêndio? Alguns corpos começam a feder. No começo tentei me guiar pelo olfato apenas e fugir, mas tudo parece em vão, este ar cadavérico vem de todas as direções, inclusive do alto e de baixo, até mesmo tive a impressão de estar pisando em algumas pessoas, se estivessem mortos não faria muito diferença, se estivessem vivos se moveriam, mas e se só tivessem forças para gritar, eu andaria sobre eles aumentando sua dor e não os ouviria, nada de ossos quebrados, nada de pedidos de ajuda, nada.
Até o momento meu corpo não sofreu nenhum arranhão mais não tenho condições de direcionamento para fugir...Imagino que há muitos que ainda tenham uma parte da visão ou ouçam um pouco e estejam tentando fugir.Que ironia anjos.Tudo esta cadavérico... Principalmente meu peito, meu coração e o cheiro desse momento infinito que parece atravessar e devorar séculos em alguns segundos.

Relatório (parte2)
Curiosamente o corpo dos anjos parece ter ficado sensível a nossa atmosfera, ou poluição, seus corpos grandes (cada anjo tem cerca de 70 a 90 metros) parecem que definham mais rápido, sua decomposição é mais rápida, aumentado o odor de putrefação no ambiente.
Se alguém for ler esse relato talvez entenda porque a pressão exercida coma queda dos anjos é tão terrível. A abertura de suas asas podem chegar a 170 metros de comprimento. Quando destroem prédios, florestas, ou quebras de grandes rochedos nas praias não parecem nada divinos.
(o restante ainda será postado)

domingo, 29 de abril de 2007

Neblina


Película de neblina que envolve o sonho mostra-me o caminho, sugere-me. Sussurre tão profundo que eu sinta em meus ossos, congele as lágrimas dos olhos, aquece meu peito em sono profundo.
Aprofunda meus medos no travesseiro
Apague os rastros que eu desenhei, cala minha fonte de desassossego.
Silêncio para uma tarde quase morta, as primeiras luzes acendem...Tédio...Badalada de relógio velho, ancestrais de meu ritmo lento...Arrasta.
Permita-me manter os olhos fechados, Apolo definha nesta tarde e minhas previsões falham.